Sagrada Família
“Teu pai e eu …”

Este texto do evangelho de Lucas, que a Igreja nos propõe este ano (C) na Festa da Sagrada Família, revela-nos como Maria e José entendem e realizam a sua missão de esposos e pais, como Jesus vive a sua condição de filho, e como os três constituem uma verdadeira família.
Antes de mais, notamos que Maria e José assumem, como casal e como pais, tudo o que diz respeito à vida de Jesus. Como fiéis cumpridores da lei, participam todos os anos na celebração da festa da Páscoa, que tem lugar em Jerusalém. Quando Jesus completa doze anos, seguindo o costume, levam-no também com eles. A Páscoa era a festa mais importante do povo, pois celebrava a sua libertação da escravidão do Egipto. Tomando parte nesta festa, Jesus insere-se na vida religiosa e na história do seu povo bem como na dinâmica da salvação de Deus.
No regresso da festa, quando dão pela falta de Jesus, os dois procuram-no exaustivamente, durante três dias, ou seja, até que O encontram. Nesta procura, Maria e José seguem a simples lógica humana. Começam por procurá-lo entre os parentes e conhecidos. Parecia-lhes normal que Ele se entretivesse, durante a viagem, junto de pessoas amigas. Depois, procuram-no pela cidade de Jerusalém. Fazia algum sentido que Jesus, estando pela primeira vez na cidade santa, permanecesse mais algum tempo para a conhecer melhor. Por último, quando já não havia mais nenhum lugar onde O procurar, é que se dirigem ao templo. Não lhes tinha passado pela cabeça que pudesse ter fica no templo! Facto que surpreenderá o próprio Jesus.
Uma vez encontrado, Maria interpela-o, em seu nome e em nome de José: “Filho, porque nos fizeste isto?” e manifesta-lhe a preocupação dos dois: “Olha que teu pai e eu andávamos aflitos à tua procura!” (Lc 2,48). Maria e José, conscientes da sua responsabilidade de pais, questionam Jesus, chamam-no à razão, sentem que Ele tem o dever de lhes dar uma explicação. Ao mesmo tempo, reconhecem-lhe o direito de se justificar e escutam atentamente a sua resposta. Agindo deste modo, mostram como o diálogo é de primordial importância na vida familiar e, muito concretamente, no processo educativo dos filhos.
E como viveu Jesus a sua condição de filho? Terminada a festa da Páscoa, sem pedir autorização nem sequer informar os pais, Jesus permanece em Jerusalém, mais concretamente no templo. À primeira vista, parece tratar-se de um gesto de rebeldia, próprio de um adolescente da sua idade. Porém, na explicação que dá aos pais, Jesus mostra que a sua decisão de ficar no templo se situa na linha do cumprimento da sua missão. Por um lado, no templo, Jesus tem como interlocutores os doutores da lei, com os quais se encontrará e discutirá, muitas vezes, ao longo do seu ministério. Por outro, Jesus quer esclarecer, desde aquele momento, que o templo, no qual se praticava um culto sem amor e em volta da qual se tinha montado um comércio lucrativo, era a casa do “meu Pai”. Mais tarde, no contexto da expulsão dos vendilhões, Jesus reafirmará que o templo é “casa de oração” (Lc 19,46).
Jesus lembra a Maria e a José que Ele tem um Pai ao qual deve obedecer, do qual recebeu uma missão que deve cumprir. No entanto, isto não O impede de viver com fidelidade a sua condição de filho de Maria e de José, sendo-lhes submisso, obediente, vivendo em plena comunhão com eles.
Em Nazaré, na companhia dos pais e graças a eles, “Jesus crescia em sabedoria, em estatura e em graça, diante de Deus e dos homens” (Lc 2,52). A família que formavam proporcionou a Jesus as condições indispensáveis a um desenvolvimento equilibrado e harmonioso, que atinge a pessoa humana no seu todo: a sua dimensão corporal, intelectual e espiritual.
Da família de Nazaré, e atendo-nos apenas a este episódio, vemos quanto é importante e necessário, para que as famílias o sejam de verdade, que os esposos e pais assumam conjuntamente a sua missão em relação aos filhos, conscientes de que eles precisam do que é específico de cada um, do ser pai e do ser mãe; a importância do procurar, dialogar, meditar no coração, para conhecer e compreender, para esclarecer dúvidas e superar divergências, para unir e criar comunhão; a necessidade de não descurar nenhum aspecto da formação da pessoa, pois desse equilíbrio depende a felicidade e o êxito de cada um e da família no seu todo.

Pe. José Manuel Martins de Almeida