Uma reflexão e revisão pastoral diante dos diocesanos, pelo Bispo da Diocese
Cumprem-se hoje, dia 16 de Janeiro, sete anos de exercício do Ministério Episcopal que me foi confiado na Diocese da Guarda. Foi no dia 21 de Dezembro de 2004 que o então Papa João Paulo II me nomeou como Bispo Coadjutor e me enviou para a Diocese da Guarda, no impedimento do Sr. D. António dos Santos, por razões de doença grave.
Lembro com profundo agrado o acolhimento caloroso que a Diocese dispensou, nesse dia frio de 16 de Janeiro de 2005, àquele que o Senhor lhe enviava.
O primeiro ano, ou seja, a ano pastoral 2005-06, foi um ano para tentar conhecer, na vastidão territorial da nossa Diocese, aqueles que são os primeiros agentes da acção pastoral – os Sacerdotes. Procurei contactar cada um no seu próprio espaço de trabalho pastoral e ao mesmo tempo aperceber-me de quais eram os outros agentes pasto­rais que os acompanhavam no serviço das comunidades e também dos principais movimentos de apostolado implantados na nossa Diocese.
Dificuldades mais acentuadas, comecei a senti-las ao terminar o primeiro ano pastoral da minha presença na Diocese, quando era necessário prover aos diferentes cargos pastorais, a começar pela responsabilidade na condução das paróquias e conjuntos de paróquias. E desde a primeira hora senti que se impunha a necessidade de todos nós – sacerdotes e povo de Deus no seu conjunto – evoluirmos da responsabilidade pastoral concentrada na única pessoa do Pároco para a efectiva partilha de responsabilidades, numa Igreja entendida essencialmente como comunhão de ministérios ao serviço da comunhão dos fiéis. Reconheço que este tem sido um caminho difícil de percorrer.
Os quatro anos seguintes (2006 a 2010) foram vividos com uma preocupação de fundo, a qual consistiu em repropor o Catecismo da Igreja Católica ao conjunto dos fiéis de toda a nossa Diocese, a começar pelos adultos e por aqueles que são praticantes regulares nas nossas comunidades. Procurámos que cada uma das quatro partes do Catecismo fosse objecto de formação na Fé dos cristãos adultos durante esses anos. E para atingirmos este objectivo elaborámos, com a colaboração de padres e leigos da nossa Diocese, um texto de apoio para cada ano. Não foi fácil fazer compreender aos fiéis que temos de passar à nova cultura da formação permanente também na Fé, a começar pelos adultos. Estamos, de facto, perante uma necessidade que o Povo Cristão continua a ter dificuldade em identificar e aceitar e nós sacerdotes confrontamo-nos com a dificuldade de fazer despertar os fiéis para esta importante realidade. Fomo-nos sentindo muito sobrecarregados com as solicitações imediatas que nos eram e são feitas predominantemente na área das celebrações. E esta realidade foi-se tornando tanto mais pesada quanto o número de paróquias teve de crescer em cada conjunto confiado ao mesmo Pároco, porque o número de sacerdotes foi diminuindo; isto, apesar de o número de pessoas, nos nossos meios, estar em progressiva queda. Na realidade, tivemos dificuldade em organizar o nosso tempo e a nossa agenda para dar à missão de ensinar, que o Senhor nos confia, o tempo e o investimento de energias de que ela precisa.
E numa primeira avaliação também eu sinto que os objectivos estabelecidos para a recepção do Catecismo da Igreja Católica na Diocese não foram inteiramente atingidos.
Mas o facto é que essa experiência permitiu-nos entrar numa outra aventura pastoral, também de formação permanente dos nossos fiéis. Essa aventura foi a proposta feita a toda a Diocese, no conjunto das suas comunidades e serviços, para progredirmos todos no encontro com Cristo vivo, através do acolhimento da sua Palavra, no Evangelho de cada ano litúrgico e com o método dos grupos bíblicos.
Assim, no ano pastoral 2010-11, foi proposto a toda a Diocese o Evangelho de Mateus. No final do ano, ao fazer a nossa revisão, verificámos que tivemos na Diocese a funcionar 60 grupos bíblicos, nos quais estiveram envolvidos participantes em número aproximado entre 700 e 800.
Não satisfeitos com os resultados conseguidos, no ano em curso, centrado no Evangelho de Marcos, sentimos que devíamos ensaiar uma reconvocação dirigida em primeiro lugar aos cristãos praticantes da Missa Dominical, mas também aos participantes ocasionais e ainda aos afastados e indiferentes.
Também sentimos que os primeiros agentes desta reconvocação têm de ser os sacerdotes e seus mais directos colaboradores pastorais. Estes têm de ser os primeiros a assumirem-se como discípulos do Mestre e também missionários da sua causa. Para nos ajudarem neste processo missionário de reconvocação, pedimos ajuda externa a dois institutos missionários – os Redentoristas e os Verbitas – que estão a trabalhar connosco. Com a sua ajuda, pretendemos atingir dois objectivos: a) mobilizar para a atitude missionária os agentes pastorais mais responsáveis, a começar pelos sacerdotes; b) sensibilizar cada comunidade cristã para a sua responsabilidade missionária de anunciar o Evangelho e convocar para o encontro com Cristo. A este processo chamamos “Missão para a Nova Evangelização”. Vivemos a esperança de que este esforço se traduza numa maior responsabilização de todos os agentes pastorais e também no aumento daqueles que se dispõem a aceitar o confronto com a Pala­vra de Deus e o consequente compromisso com a vida da comuni­dade cristã.
Com as visitas pastorais às 365 Paróquias da nossa Diocese, por arciprestados, que comecei ainda no ano pastoral 2005-06, propus-me passar um dia de semana em cada paróquia e voltar no domingo seguinte para dar orientações na Missa Dominical. Este processo foi interrompido ao longo de todo o ano sacerdotal e espero que esteja terminado no final deste ano civil. Para as visitas pastorais há um objectivo prioritário estabelecido que é identificar em cada conjunto de Paróquias os cooperadores pastorais do mesmo Pároco e promo­ver a sua corresponsabilidade pastoral.
Durantes estes sete anos houve alguns marcos na vida da nossa Diocese que desejo recordar.
Um deles foi a assembleia geral do Clero realizada em 2010, em pleno ano sacerdotal. Nela foram apontados alguns caminhos que estão a marcar o ritmo pastoral da Diocese. Assim, depois e recomendar uma mensagem do Clero à Diocese, em ano sacerdotal, pediu a criação de um secretariado diocesano do Clero presidido por um vigário episcopal para o Clero. Pediu ainda que fosse criado um serviço de apoio “jurídico-pastoral” às paróquias e seus agentes pastorais e ainda que oportunamente fosse também organizada uma assembleia de todo o povo de Deus da Diocese (de representantes do Povo de Deus, entenda-se).
Também os nossos Seminários tiveram de sofrer transformações. Assim, o Seminário Maior procurou aprofundar a cooperação com os Seminários Maiores das outras três Dioceses que estão comprometidas com o mesmo Instituto Superior de Teologia, sediado em Viseu. Não foi fácil o ajustamento às novas circunstâncias e há vários aspectos da vida do Seminário que precisam de continuar a ser reflectidos. Também o Seminário Menor do Fundão sofreu uma grande mudança, quando as circunstâncias impuseram que deixasse de ter escola de ensino básico e secundário própria. Optámos pela solução de fazer do Colégio de Nossa Senhora dos Remédios, no Tortosendo, a escola do Seminário Menor e, de facto, é aí que os alunos seminaristas passam a maior parte do seu tempo, no dia a dia. Continua a precisar de reflexão o Seminário Menor nas actuais circunstâncias, incluindo a sua relação com o Pré-seminário ou Seminário em Família. A preocupação pela pastoral das vocações sacerdotais foi constante, embora continue com a consciência de que ela deve ser mais partilhada por todos os agentes pastorais, incluindo os sacerdotes.
Também houve esforço por dar atenção à realidade da vida concreta das pessoas que vivem neste nosso interior, mais ou menos raiano, sujeito a muitas pressões de esvaziamento e de algum abandono. Senti e continuo a sentir que não podemos silenciar as implicações. Continuo a sentirar e a ajudar a encontrar caminhos de sustentabilidade para os nossos meios e defesa dos mais carenciados. O Evangelho como contributo para ajudar a encontrar caminhos de sustentabilidade para os nossos meios e defesa dos mais carenciados.
Olhando agora para a frente, vejo que precisamos de concentrar a nossa atenção principalmente nas seguintes prioridades pastorais:
1º)A primeira é o nosso Presbitério. Precisamos de continuar a criar todas as condições possíveis para que o nosso Presbitério seja cada vez mais a Fraternidade Sacramental recomendada pelo Concílio. Sinto que nós sacerdotes precisamos de assumir com crescente coragem a nossa missão fundamental de educadores dos fiéis e das comunidades, evitando sempre dois extremos – o autoritarismo e a demissão. Sinto também que temos de progredir na capacidade de trabalho em equipa – entre nós, com os diáconos e com os leigos, especialmen­te os nossos cooperadores pastorais mais directos.
2º)Dentro do grande objectivo pastoral que é criar comunhão de ministérios ao serviço da comunhão da Igreja, temos de continuar a desenvolver todos os esforços para dar aos 18 diáconos permanentes ordenados para serviço da nossa Diocese o lugar que lhes compete na vida e acção pastoral das comunidades. Precisamos que o Directório sobre a vida e o ministério dos diáconos permanentes, sobretudo quanto ás orientações que dá para as três diaconias – da caridade, da Palavra e da liturgia – seja de facto aplicado.
3º)Precisamos de continuar a repensar cada conjunto de paróquias confiado ao mesmo Pároco, admitindo que temos de fazer modificações nesses conjunto e nas acções pastorais desenvolvidas dentro de cada um deles. Esse repensar está já em curso, dando cumprimento ao nosso programa pastoral para este ano e procurando envolver nele todos os órgãos de consulta e decisão da Diocese. Na mesma linha de preocupações, também queremos continuar a valorizar os arciprestados como instâncias de planeamento e acompanhamento pastoral, com participação de sacerdotes, diáconos (onde houver), leigos e comunidades religiosas (onde houver). Aqui o Conselho Pastoral Arciprestal, que estamos a promover com regulamento próprio, será um bom instrumento na medida em que formos capazes de o pôr a funcionar. Também para permitir aos arciprestados assumirem estas novas funções, com a participação de leigos, a formação permanente do Clero passou do âmbito arciprestal para o da zona pastoral.
4º) Queremos dar cumprimento à indicação da última assembleia geral do Clero no sentido de convocar oportunamente uma assembleia de representantes de todo o povo de Deus da Diocese. As circunstâncias aconselham que preparemos e realizemos este evento no quadro das comemorações do cinquentenário do Concílio Vaticano II, procurando avaliar como está a ser feita sua recepção na nossa Diocese. E isto também no contexto da vivência do ano da Fé proposto pelo Papa Bento XVI.
5º) Sinto que temos de repensar constantemente a acção desenvolvida pelos diferentes Secretariados e Departamentos de acção pastoral da Diocese e também dos diferentes movimentos, serviços e obras de apostolado que temos ao serviço da formação e vivência da Fé.
6º) A terminar, desejo dizer a todos, mas particularmente aos nossos padres e diáconos que coloco muita esperança na próxima assembleia geral do Clero calendarizada para o mês de Maio deste ano.
Guarda, 16 de Janeiro de 2012
+Manuel R. Felício, Bispo da Guarda.