FUNDÃO – HÁ TIJOLOS

Foi anunciado por diversas vias e assim tive conhecimento que “O VIGILANTE NOCTURNO” ia entrar em cena no palco da Moagem, uma co-produção do Teatro da Didascália, da Casa das Artes de Vila Nova de Famalicão e do Centro Cultural Vila Flor.

Abdiquei de ver o jogo do meu clube do coração com um dos grandes e fui ao Teatro. Em boa hora tomei esta decisão, pois  com tantos vars, emails, toupeiras, apitos doirados, árbitros e arbitrariedades, o futebol não se joga mais nas quatro linhas. Mais de meia centena também optou por ir ao Teatro.

Dirigi-me à bilheteira, como havia descontos para a terceira idade puxei pelos  “galões” da velhice e poupei dois euros e meio. São pequenos mas saboroços rebuçados… Na minha aldeia, a minha mãe ensinou-me “que grão a grão enche a galinha o papo”.

Na entrega do bilhete, recebi um tijolo, um guião da peça de teatro.

Desdobrei-o e li a ficha técnica, um registo histórico muito interessante de “O VIGILANTE NOCTURNO”. A peça abre de manhã com um Actor num longo monólogo, talvez a parte mais desinteressante e monótona. Chegam baldes de plástico. O estaleiro está repleto de materiais de construção civil, tubos para todos os fins, tijolos, muitos tijolos, ripas de madeira, martelos, pás, areia, cimento, toldos…

Passada uma hora, os tijolos continuam a aborrecê-lo, porque sempre que dá uma ronda estão fora do lugar, obrigando-o a tomar medidas drásticas.

Dois minutos depois, conhece os efeitos avassaladores dos martelos.

Alguns materiais de construção começam a sentir os efeitos do stress, é difícil mantê-los no lugar e o actor suspeita que está a ser vigiado por dois tubos dos esgotos.

É atacado nas costas por uma corda, enrolado nos taipais e até os baldes olham furiosos para ele. Deseja que chegue um carregamento com novos baldes e novos olhares.

A revolução dos materiais está para acontecer,  os pedaços de tijolos estão em ebulição. A qualquer momento vai dar-se a explosão e o Vigilante Nocturno está sozinho, sujeito a todos os perigos e peripécias, mantendo uma relação atribulada com os materiais de construção civil.

Um novo tijolo, que pensava ser diferente, é afinal igual a tantos outros. O Vigilante Noturno morre debaixo dos escombros dos materiais, conforme noticia a comunicação social.

De manhã cedinho avisam: “se alguém estiver a ler este registo, é porque os materiais levaram a melhor.”

Destaque para os sons musicais, muito bem enquadrados com o desenrolar dos passos do “VIGILANTE NOCTURNO.”

António Alves Fernandes

Aldeia de Joanes

Setembro/2018

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