LAVACOLHOS – FESTA DE SANTO AMARO E DOS TORDOS

O dia 15 de Janeiro surgiu com o sol a aquecer uma manhã gelada e com o estrondo de uma alvorada religioso-profana.

Em Lavacolhos festejava-se o Santo Amaro, o Padroeiro da Freguesia, que deu nome à rua principal. Como há dias um famoso apresentador da RTP 1 não sabia situar esta localidade, digo-lhe aqui que Lavacolhos é uma freguesia do concelho do Fundão que o receberá muito bem.

Segundo um dos filhos de Lavacolhos, o Padre Abel Guerra, ex-reitor do Seminário dos Jesuítas de Macieira de Cambra e de Sortelho (Braga), a génese deste nome vem do latim: “levo (levantar), levis na acepção de suave e belo, collum (colo, pescoço) e collis (colina, outeiro). Tudo amanhado, mal ou bem, deu origem a Lavacollus e depois, em português corrente, a Lavacolhos, isto é, uma terra que levanta a cabeça, uma terra de suaves colinas, entre a Serra da Estrela e a Gardunha.

Esta é uma aldeia rica em identidades patrimoniais, culturais e naturais: a Casa do Bombo, a Igreja, as Capelas, as Casas de Xisto, os Penitentes, o romance “Os Betórias” de Carlos Gravito, as encostas de olivais, as hortas verdejantes, uma praia fluvial, as pessoas que são sempre a maior riqueza de uma terra, e as personalidades como o já referido Carlos Gravito, o Padre Jesuíta Joaquim e o seu irmão Abel Guerra, entre outros.

Há em Lavacolhos duas grandes festividades, uma no Inverno, sempre a 15 de Janeiro, o Santo Amaro, e outra no Verão, a do Senhor da Saúde, esta para reunir a família dos emigrantes.

Nada melhor do que ouvir os seus habitantes sobre a Festa de Santo Amaro, por quem têm uma profunda devoção, que começa nas vésperas com a Festa dos Tordos: mais de três centenas caíram nas mesas dos forasteiros no Centro de Convívio.

Maria Manuela Catarino Borges Barroca: “não há gente como a de Lavacolhos para manter as tradições e as suas festas. O meu falecido marido recomendava inúmeras vezes aos meus filhos para nunca deixarem morrer a Festa de Santo Amaro. Já nos tempos dos meus avós se matinha a tradição de se comerem tordos, mas como a família era numerosa cozinhavam-se com muito arroz. Nos dias de hoje comem-se em petiscos.”

Joaquim Mateus: “é o nosso Padroeiro e é sempre no dia 15 de Janeiro, haja sol, chuva ou neve. Já o quiserem chutar para um domingo, mas não conseguiram. A data já foi assunto de Assembleia de Freguesia, mas esta por unanimidade manteve a data, porque o povo é quem mais ordena. Diziam os antigos que num ano alteraram a data para Agosto e como castigo nevou todo o dia. Aprenderam assim a respeitar a tradição.

Era o nosso Santo Ortopédico, óptimo na reabilitação de braços e pernas… Antigamente não faltavam objectos de cera para pagar as promessas.”

Américo José Simão: “Este Santo é um dos mais célebres artesãos de bombos… É feriado, dia santo em Lavacolhos, e todos o respeitam. Os bombos saem à rua.”

Abílio Daniel Guerra: “a festa de Santo Amaro é a mais genuína e simples, unifica toda uma população em interligação profana e religiosa. Pertencemos a uma identidade geográfica única, mas multifacetada, com tradições, cultura, natureza, lazer, sons musicais dos bombos e dos penitentes, sons que esperamos reconhecidos brevemente com a classificação de património imaterial da humanidade. Somos um Povo unido, de cabeça erguida, guerreiro no bom sentido da palavra. Só quem toca um bombo compreende a valentia deste Povo de Lavacolhos.”

Neste ano, o Santo Amaro primitivo, depois de alguns esforços técnicos e humanos, foi colocado no seu andor e percorreu as ruas estreitas, ornamentadas com pedras de xisto, com um rosário na mão direita e o evangelho na esquerda.

Com novos e velhos atrás do Grupo dos Bombos de Lavacolhos, demos um grito de guerra – “quanto mais acima, maior é o salto!” – e despedimo-nos irmanados pelas vozes e pelos batuques, sempre de cabeça levantada e com força para combater qualquer desânimo.

António Alves Fernandes

Aldeia de Joanes

Janeiro/2019