Na semana passada, Jesus ensinou-nos a corrigir com caridade o irmão que nos ofende. Então, vimos que o perdão é o primeiro e mais importante passo da correcção fraterna. Hoje, Jesus diz-nos que é necessário perdoar e perdoar sempre, para que Deus também nos perdoe sempre os nossos pecados.
Perdoar sempre e a todos é uma exigência do amor ao próximo, pois este abrange os próprios inimigos. Ora, como não existe limite para o amor, não pode haver um limite para o perdão.
À primeira vista e desde uma perspectiva meramente humana, perdoar afigura-se como dar razão e declarar vencedor aquele que nos fez mal. Porém, não é isso o que o perdão reclama. Perdoar não significa renunciar à razão, à verdade, à justiça e ao bem. Não implica, de modo algum, a aprovação e aceitação do mal e da injustiça praticados. Perdoar implica, isso sim, reconhecer que o irmão, apesar de ter sido injusto para connosco, continua a merecer o nosso amor e um lugar no nosso coração. Perdoar é dizer, de um modo muito concreto e muito credível, que o amor é mais forte do que o pecado; que nada, seja qual for a gravidade da ofensa, legitima deixar de amar o irmão, excluindo-o das nossas relações pessoais; que o nosso dever de amar prevalece em todas as circunstâncias e em relação a todas as pessoas.
Perdoar ao irmão “de todo o coração” é condição essencial para que Deus nos perdoe a nós. Essa é a mensagem central da parábola. O primeiro servo representa cada um de nós e a sua dívida de “dez mil talentos” põe em evidência a gravidade das ofensas que cometemos contra Deus. Trata-se de uma “dívida” tão grande que ninguém só por si a consegue pagar. Por sua vez, o rei que dá liberdade ao servo, mesmo sem este lhe pagar o que lhe devia, representa Deus que é misericordioso e compassivo para com o pecador arrependido. O amor de Deus é incomparavelmente maior do que o pecado do homem.
O segundo servo, que deve ao primeiro cem denários, representa o irmão que nos ofende. Cem denários é uma ninharia quando comparada com dez mil talentos. O mesmo se pode dizer da gravidade da ofensa que nos é feita, se confrontada com a que nós fazemos a Deus. O servo que se recusa a perdoar a dívida do seu companheiro representa todos aqueles que, muito embora precisando do perdão de Deus, se recusam a perdoar. Como não imitou a compaixão do seu senhor, este revoga o perdão que lhe tinha concedido, uma vez que manifestou não ser digno dele.
Jesus conclui, afirmando que Deus procederá do mesmo modo em relação a todos aqueles que não perdoam. Na mesma linha, já no final da oração do Pai-Nosso e para rebater a necessidade de perdoar, Jesus afirmara claramente: “Se, porém, não perdoardes aos homens as suas ofensas, também o vosso Pai vos não perdoará as vossas” (Mt 6,15).
A reacção de Deus parece contradizer o seu amor misericordioso. Como que dá a impressão de ser uma certa”vingança”: “já que não perdoas ao teu irmão, também Eu te não perdoo a ti”. Mas não é isso o que realmente acontece. Não é Deus que não quer perdoar, mas é o homem que não está em condições de receber o perdão que Deus deseja conceder-lhe. Dito de outro modo: O coração de quem não tem amor para perdoar também não tem capacidade para acolher o amor de Deus. Não amando, o homem impede Deus de o amar.
Perdoar para ser perdoado. É uma questão de coerência, como já o advertiu autor do livro de Ben-Sirá (primeira leitura): “Um homem não tem compaixão do seu semelhante e pede perdão para os seus próprios pecados?” E propõe ao homem a solução justa: “Perdoa a ofensa do teu próximo e, quando o pedires, as tuas ofensas serão perdoadas”.
Deus não dá outra alternativa. Por isso, atenção! Não te iludas, pensando que a confissão dos teus pecados ao sacerdote te dispensa de perdoares, interior e pessoalmente, a quem te ofendeu. Não aconteça que voltes da confissão sacramental sem teres alcançado o perdão dos teus pecados, por tu não teres perdoado ao teu irmão!
E não basta dizer que lhe perdoas. É necessário que o confirmes pelo modo como vives e te relacionas com ele. É preciso que as pessoas dêem conta que, efectivamente, lhe perdoaste “de todo o teu coração.
O perdão aos inimigos é o gesto de amor que melhor revela a autenticidade da nossa fé e nos identifica com Cristo, Ele que, na cruz, perdoou e implorou o perdão para os seus inimigos.

por: Pe. José Manuel Martins de Almeida