Quando a minha mente se ligou ao coração.

Houve um dia em que acordei de manhã e tudo estava diferente. Liguei a televisão e ouvia noticias sobre a guerra, sobre os políticos corruptos, sobre todas as drogas que intoxicavam o mundo, o meu mundo. Eu, que ontem à noite me tinha deitado feliz, agora sentia-me triste. Nessa manhã, não sabia o que fazer para voltar a sentir-me feliz, novamente. 
Depois de me vestir e tomar um pequeno almoço rápido, desci para a garagem e estava uma senhora nas escadas que me ajudou quando o meu guarda chuva caiu ao chão. “Aqui está!” disse ela, muito alegre, enquanto eu continuava o meu caminho para a porta do carro. Não lhe respondi nada, pois a minha mente estava tão preocupada a pensar como poderia consertar o mundo para eu voltar a ser feliz, que não tinha tempo para lhe dizer OBRIGADA. Ela já sabia que eu lhe agradecia!
Lá continuei o meu dia, passei ainda por umas quantas desagradáveis situações: no trânsito tive de “ralhar” com um condutor que achava que poderia meter-se à minha frente, no trabalho tive de fazer uma chamada a reclamar que os desenhos não estavam com a cor que havíamos pedido pois veio tudo errado e, por falta de tempo, até o meu almoço apenas se resumiu a uma chavena de chá e uma sande de queijo. 
Até ao final do dia foi assim, não consegui parar um minuto para pensar o que poderia fazer para voltar a sentir-me feliz, não tive tempo! Todos queriam falar comigo sobre o jantar que tinhamos de marcar, sobre o problema que tinham com as namoradas, sobre o concerto em que a filha tinha tocado ontem à noite. Deixem-me em paz, eu tenho coisas muito mais importantes em que pensar! O mundo está errado e eu quero que fique tudo bem novamente, quero que sejam todos felizes!
Deveria ser já de noite quando furei um pneu. 
Deveria ser já muito tarde quando o reboque me disse que estava do outro lado do mundo e não conseguia vir já. Deveria ser já escuro quando o meu pai estava no futebol, o meu irmão na empresa e o meu marido a dar aulas. Deveria ser já tão tarde, que me sentei sozinha, sem saber mudar um pneu, a querer conversar com alguém, a precisar de ajuda. Só me lembrava da senhora que hoje me ajudou com guarda chuva nas escadas da garagem precisava tanto dela agora, ela tinha cara de quem sabia mudar um pneu… Precisava de uma ajuda, apenas uma ajuda com este pneu que eu nao sabia mudar. Porque ninguem me ajuda? Estava eu a sentir-me a vitima mais infeliz deste mundo, quando a minha mente se ligou ao coração e eu descobri a resposta.
Passei o dia todo a ignorar a felicidade, quando me bastava ter dado um sorriso à senhora das escadas para todo o meu mundo melhorar. Bastava-me ter conversado um pouco com os meus amigos, ouvir as suas histórias, recolher as suas piadas. Bastava-me até, não ter reclamado com a cor, mas simplesmente pedir para alterarem os desenhos. Se eu tivesse deixado o senhor entrar à minha frente no trânsito, talvez até o meu pneu não estivesse furado agora.
Senti uma enorme enorme vontade de adormecer novamente e voltar todo o meu dia para trás, mas não posso reviver o passado. Pode parecer um cliché, mas a verdade é que somos felizes nas pequenas coisas e eu passei o meu dia inteiro apenas preocupada com uma grande coisa que não dependia de mim, ao invés de estar presente e aproveitar os pequenos momentos do meu dia.
Depois do reboque aparecer, uma hora e meia mais tarde, dei um sorriso ao senhor António, agradeci-lhe ter vindo ajudar-me e a resposta dele foi: “Oh menina, obrigado eu! Tive um dia tão mau com esta chuva, vi tantos acidentes, que a menina nem imagina o que significa terminar o meu dia com um final feliz… Obrigada por esperar por mim!” 
Nesse momento, com as patéticas lágrimas a baterem à porta dos meus olhos, a minha mente decidiu não voltar a ligar a televisão de manhã, e o meu coração resolveu começar a esperar algum tempo por mim própria. Como? Vou começar a esperar algum tempo, seja ele qual for, pelos outros que me rodeiam também.
Diana Teixeira de Carvalho