V – Domingo da Quaresma

“Não voltes a pecar”

 

             A mulher pecou e o seu pecado é grave: “foi surpreendida em flagrante adultério”. Traiu o amor do marido e da família. Transgrediu o mandamento de Deus: “Não cometerás adultério”. Porém, o mandamento não manda apedrejar as mulheres adúlteras até à morte. Esta é apenas uma lei dos homens. E trata-se de uma lei manifestamente desumana e discriminatória.

            Antes de mais, atenta contra a vida humana e toda a lei que legitima a morte, mesmo que seja para punir o pior criminoso, é desumana. Depois, deixa de fora os homens adúlteros, como se a proibição do mandamento de Deus não abrangesse os homens. A lei não prevê qualquer sanção para o homem com o qual a mulher comete adultério.

            Os escribas e fariseus olham para a mulher e concentram-se apenas no seu pecado e na lei que o manda punir com a lapidação. Consideram a lei mais importante do que a mulher e o cumprimento da lei mais importante do que a vida da mulher. Cegos pela lei, não dão qualquer oportunidade à mulher para se defender nem levam em conta se ela está ou não arrependida. A lei, segundo eles, sobrepõe-se ao direito à vida e ao valor do arrependimento.

            A mulher é colocada diante de Jesus e permanece em completo silêncio. Não nega o seu pecado nem pede para não ser condenada. O seu silêncio, por um lado, é sinal de reconhecimento da culpa. E, por outro, parece ser uma manifestação de confiança em Jesus. Ela nota que Jesus está a olhar para o chão e a escrever com o dedo na terra, dando a impressão de não dar muita importância às palavras e aos argumentos dos escribas e fariseus. Mais confiante deve ter ficado, ao escutar a interpelação de Jesus: “Quem de entre vós estiver sem pecado atire a primeira pedra”, e ao constatar que todos se afastaram. A confiança torna-se inabalável, quando Jesus, olhando para ela e dirigindo-lhe a palavra, lhe revela: “nem Eu te condeno”.

            Jesus sabe que a mulher pecou. No entanto, considera que a solução para o pecado não está no castigo, muito menos na pena de morte. A solução está no arrependimento e no perdão. O arrependimento do pecador dá direito ao perdão de Deus e o perdão de Deus regenera o pecador arrependido, está ao serviço da vida.

            “Quem de entre vós estiver sem pecado atire a primeira pedra”. Jesus obriga-os a olhar para dentro, a examinar as suas vidas, a tomar consciência do mal que existe neles. A interpelação de Jesus surtiu o efeito desejado. Todos se retiraram. Quando é confrontado com o seu pecado, quando lhe fazem ver que também é transgressor, o homem perde a arrogância, dá conta que não tem autoridade para condenar ninguém.

            Jesus sabe que a mulher pecou, mas não condena a mulher. Ele não veio para condenar, mas para procurar e salvar os que andavam perdidos, manifestando-lhes o amor misericordioso de Deus. Jesus não a condena. Porém, o amor que lhe manifesta e o perdão que lhe concede exigem dela uma vida nova: “não tornes a pecar”. Vai, regressa a tua casa, volta para o teu marido, procura a tua felicidade no conforto e na amizade da tua família.

            Jesus perdoou à mulher adúltera, mas não disse nem quis significar que o adultério não é um pecado grave. Aliás, no sermão da montanha, Jesus estende o pecado de adultério ao campo do simples desejo: “digo-vos que todo aquele que olhar para uma mulher, desejando-a, já cometeu adultério com ela no seu coração” (Mt 5,28). O adultério, quer seja cometido pelo homem quer pela mulher, constitui um atentado grave contra o casamento e a família, ou seja, contra a fidelidade do amor. Jesus perdoou à mulher, porque viu que esta estava profundamente arrependida. Se não estivesse arrependida, certamente não a condenaria à morte, mas também não a podia perdoar. Sem arrependimento, a mulher não experimentaria a graça do perdão nem a alegria de poder começar uma vida nova.

            “Quem de entre vós … “ Nenhum de nós está em condições de atirar pedras aos outros. Além disso, o mal que existe no coração do homem não se elimina à pedrada! O pecado vence-se com o arrependimento e o perdão. O perdão de Deus renova-nos interiormente: torna a nossa consciência mais leve, o nosso coração mais puro, a nossa vontade mais dócil, o nosso olhar mais transparente, rejuvenesce a nossa vida e faz de nós pessoas verdadeiramente livres.

Pe. José Manuel Martins de Almeida