“Marta, Marta …”

             Marta e Maria, como em tantas outras ocasiões, recebem Jesus em sua casa. As duas irmãs, cada uma a seu modo, fazem o que julgam ser melhor para que Jesus se sinta bem e tenha o acolhimento que merece. Marta ocupa-se da refeição, enquanto Maria se senta aos pés de Jesus e escuta a sua palavra.

            Marta, absorvida e preocupada com muitas coisas, fica agitada e stressada, perde a lucidez e a serenidade. Ao ver a irmã sem fazer nada, começa a ferver por dentro e manifesta toda a sua irritação. Condena a atitude de Maria e censura o próprio Jesus: “Não te importas que minha irmã me deixe sozinha a servir? Diz-lhe que venha ajudar-me”. Marta, pensando apenas no êxito da refeição, não compreende que Maria, fazendo companhia a Jesus e prestando atenção às suas palavras, está a cumprir uma parte importantíssima da verdadeira hospitalidade.

             A hospitalidade não se esgota no receber o convidado em casa e oferecer-lhe uma boa refeição. Ela exige que se preste atenção à pessoa e que esta tenha a oportunidade de partilhar as riquezas do seu saber, dos seus afectos e das suas experiências. E, naquele caso, o hóspede divino tinha tanto para partilhar!

            Jesus sabe que o trabalho de Marta é indispensável e não pode deixar de o apreciar. No entanto, adverte-a para que ela, dando excessiva atenção ao que é secundário, não acabe por perder o que é mais importante e necessário. Mais importante do que a refeição é o convidado. Maria foi mais sensata, escolheu a melhor parte, ou seja, escolheu o próprio Jesus e a sua palavra. Maria, sentando-se aos pés de Jesus, tomou a atitude do discípulo, consciente de que, muito para além da refeição, a pessoa humana precisa de se alimentar da palavra de Deus e de acolher Deus na sua própria vida.

            Maria recebeu Jesus em sua casa e acolheu-O também na sua vida. Marta, por sua vez, corre o risco de, apesar de ter Jesus tão próximo de si, não lhe abrir as portas do seu coração! Corre o risco de andar atarefada a pretexto de servir Jesus e, ao mesmo tempo, não deixar que Jesus lhe sirva o manjar suculento da sua palavra e do seu amor.

            “Marta, Marta …”. Marta quer dar nas vistas, fazer uma boa figura, impressionar os convidados, mostrar que sabe receber bem e, no final, ser elogiada por todos. Marta pensa mais no que ela tem para dar a Jesus do que no que Ele tem para lhe oferecer. Ela sabe que Jesus, enquanto homem, tem necessidade do alimento para viver, mas esquece que ela tem necessidade da palavra de Deus para se salvar. Por isso mesmo, Jesus interpela-a, quer que ela pare e reflicta, para não sobrepor o material ao espiritual, a acção à contemplação, o imediato e efémero ao que é eterno.

            “Marta, Marta …”. Hoje, Jesus dirige a mesma interpelação e com o mesmo objectivo a muitos dos trabalhadores da seara de Deus. Andais tão ocupados e apressados, numa correria contínua de um lado para o outro, tendes uma agenda tão preenchida com tantas celebrações e reuniões, gastais tanto tempo a falar de mim. No entanto, noto que passais pouco ou nenhum tempo comigo, não me dais a oportunidade de vos falar ao coração, de partilhar convosco os segredos e a vida íntima de Deus. Não tendes tempo para escutar a minha palavra, para perscrutar a vontade de Deus de Deus a vosso respeito. Sem este contacto pessoal comigo, como podereis falar de mim com convicção e com paixão? E, consequentemente, como poderei eu chegar ao coração e à vida dos homens?

            Sentai-vos ao meu lado, sem pressas, com a mente e o coração desocupados e disponíveis. Fixai em mim o vosso olhar e a vossa atenção. Não é perda de tempo o tempo do silêncio, do retiro, da oração. O muito que fazeis, se o fazeis sem mim, está condenado ao fracasso, não produz frutos, não é útil a ninguém. Por isso, falai menos e escutai mais; fazei menos e contemplai mais. Confiai menos em vós, nas vossas habilidades humanas e nas técnicas pastorais. Confiai mais na graça de Deus, na inspiração do Espírito Santo e deixai que seja eu a falar e a agir em vós. Caso contrário, podereis fazer muitas coisas bonitas e que entusiasmam, momentaneamente, as pessoas. Podereis mesmo receber aplausos, ser notícia e conseguir progredir na vossa carreira. Mas como a casa construída sobre a areia, mais cedo ou mais tarde, normalmente mais cedo do que tarde, tudo se desvanecerá. Então experimentareis um terrível vazio interior e sentir-vos-eis tremendamente infelizes e inúteis. Não esqueçais: “sem mim nada podeis fazer”.

 

Pe. José Manuel Martins de Almeida