V – Domingo da Páscoa
“Como Eu vos amei …”.
Jesus, enquanto celebrava a ceia pascal com os seus discípulos e dirigindo-se directamente a eles, formula e revela o novo mandamento do amor. Os apóstolos devem amar-se uns aos outros como Jesus os amou. Só assim eles poderão ser identificados e reconhecidos como seus discípulos.
Durante a última ceia, Jesus institui o sacramento da Eucaristia como o memorial da sua paixão e morte. Esta constitui a expressão máxima do seu amor pelos homens, pois “ninguém tem mais amor do que quem dá a vida pelos seus amigos” (Jo 15,13). A Eucaristia, enquanto memorial desta doação de Jesus, é, por excelência, o sacramento do Amor. Parece de todo lógico que aqueles que, como os apóstolos, têm a missão de celebrar o Sacramento do amor de Deus, tenham também o dever de darem testemunho desse amor, amando-se uns aos outros como o próprio Jesus os amou.
Ainda durante a última ceia, segundo a narrativa de João, Jesus lava os pés aos apóstolos. Ao agir deste modo, contra toda a lógica do mundo, Jesus faz do lava-pés um gesto/sinal do amor que deve animar as relações entre os homens. Quem ama de verdade, não se põe a considerar os deveres dos outros em relação a si. Em vez disso, dispõe-se a servir os demais, a agir em seu favor, a viver em função deles, a dar-se a eles.
Na Eucaristia e no gesto do lava-pés temos, pois, a chave de compreensão do mandamento novo do amor – um mandamento que tem como primeiros e principais destinatários os apóstolos.
“Como Eu vos amei”. Esta é a novidade do mandamento do amor fraterno! Os apóstolos devem amar-se entre si como Jesus os ama e não apenas segundo a formulação anterior do mandamento: “amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Lev 19,18). E como é que Jesus os ama? Mais à frente e ainda no seguimento da mesma conversa com os apóstolos, Jesus, voltando ao tema do mandamento do amor, explicita: “Assim como o Pai me tem amor, assim Eu vos amo a vós” (Jo 15,9). Jesus ama os apóstolos com o mesmo amor com que é amado pelo Pai. Consequentemente, os apóstolos devem amar-se uns aos outros como Deus ama o seu Filho.
Deus é amor, é a fonte de todo o amor. Nós temos capacidade de amar porque Deus nos ama primeiro. E amando-nos, Deus torna-nos capazes de amar como Ele ama. Como Deus, é Jesus quem toma a iniciativa de amar os apóstolos: “Não fostes vós que me escolhestes; fui Eu que vos escolhi a vós” (Jo 15,16). O amor de Jesus, como o de Deus, é absolutamente gratuito, não está dependente de nada, não põe pré-condições ao homem.
Jesus trata os apóstolos como amigos: “Já não vos chamo servos; mas a vós chamei-vos amigos, porque vos dei a conhecer tudo o que ouvi a meu Pai” (Jo 15,15). O amor de Jesus anula todas as diferenças e distâncias humanas desnecessárias e injustificáveis.
O amor de Deus faz dos homens filhos. Para Deus, não existem súbditos. Por sua vez, o amor de Jesus faz dos apóstolos amigos e irmãos. Para Jesus, porque ama como Deus O ama, não existem servos. Por isso mesmo, Jesus confia neles ao ponto de lhes revelar os segredos de Deus.
Jesus ama até ao extremo de dar a sua vida pelos amigos (Jo 15,12). Como o de Deus, o amor de Jesus não conhece qualquer limite: é doação total de si mesmo e abrange todos os homens. O amor de Jesus inclui o perdão aos seus inimigos, como Ele mostrará no alto da cruz (Lc 23,34). É assim que Jesus ama. É assim, por conseguinte, que os apóstolos se devem amar uns aos outros.
“Que vos ameis uns aos outros”. Os apóstolos têm a missão de anunciar e testemunhar o amor de Jesus pelos homens. Se eles não vivem o amor fraterno entre si, como o poderão testemunhar? E se não dão testemunho, quem acreditará nas suas palavras? Quem acreditará no amor de Jesus? Quem tomará a sério o amor aos inimigos? Se não se amam uns aos outros, como poderão amar efectivamente os homens a quem são enviados, também aqueles que os insultam e caluniam, perseguem e maltratam?
O que vale para os apóstolos vale para os cristãos de todos os tempos. Só pelo amor fraterno, amando como Ele ama, serão reconhecidos como seus discípulos e os homens, por meio do seu testemunho, acreditarão que Jesus é o enviado de Deus para os salvar.
Pe. José Manuel Martins de Almeida