ALDEIA DE JOANES – O DECANO PORTUGUÊS EM TIMOR
Em Outubro de 1964, José Serra deixou Aldeia de Joanes a caminho de Timor, à procura de um futuro melhor. Deixou a mulher, Maria Ascensão Macedo, natural de S. Vicente da Beira, aos cuidados de um filho com quinze dias. Nunca chegou a dar notícias e não se sabe em que contexto teve esta postura, este comportamento.
Naquele longínquo território contava com o apoio de um irmão ali emigrado. Inicialmente as suas relações foram de estreita colaboração, mas depressa se deterioraram. Libertou-se da dependência do irmão mais velho, solicitou junto do Governador apoio, dinheiro, material agrícola e cabeças de gado, fixando residência na Zona de Ribeira de Loves. Com muito trabalho chegou a ter quatrocentas cabeças de gado e plantações de café.
Aconteceu o 25 de Abril em Portugal, com reflexos sociais e políticos em todo o território nacional e nas ex-Colónias. Em Timor começaram a aparecer diversos partidos com as mais diversas ideologias. Surgiram muitas desavenças com consequências gravosas e trágicas.
Deu-se a ocupação por parte das Forças da Indonésia e fecharam as portas das fronteiras. José Serra, o decano dos portugueses em Timor, abandonou o gado, as plantações de café e fugiu para as montanhas. Alistou-se na FRETILIN, na luta clandestina contra o invasor, com o nome de Comandante Barbute. Durante três anos esteve na linha da frente, trabalhando para escorraçar o invasor indonésio até ser preso.
Libertado o território de Timor, concretizado o referendo, o povo decidiu-se pela independência. José Serra jurou: “se ficarmos independentes não volto a Portugal. Quero morrer em Timor.”
As primeiras notícias que chegaram a Portugal desta personagem de Aldeia de Joanes são veiculadas pelo Pastor Evangélico, seu conterrâneo, Juvenal Calvário Clemente, que em missão evangélica visitou diversas vezes aquele País, através de Macau, onde tinha residência.
Na primeira viagem missionária ainda Timor se encontrava sob domínio indonésio. Diz o Pastor Evangélico Juvenal que “ foi uma autêntica aventura, foi preciso muita coragem, tomar uma decisão firme.”
Numa dessas deslocações, e já com Timor livre, a comunidade de cristãos evangélicos indicou o nome de dois portugueses, um do Porto e um de Aldeia de Joanes – Fundão. Quando lhe falaram do seu conterrâneo fez todas as diligências para o localizar e conversar. Foi descobri-lo na localidade de Vato Boro, perto da Vila Maubura, com muitas cabeças de gado, plantações de café e produtor hortícola: “foi fantástico encontrar um Homem rodeado por inúmeras crianças timorenses, que apoiava e ajudava, juntamente com as suas mães, chamavam-lhe o Avô Serra. Interroguei-o como era possível um Homem ter abandonado a família em Portugal e estar em Timor a ajudar tantas famílias”. São os desígnios da vida… De resto, queixou-se de uma Empresa Portuguesa comprar o Café de Timor, obrigando-os a vender por preços mais baixos, por falta de concorrência.
Pediu para dar notícias ao filho, residente no Tortosendo, tendo em vista uma possível reconciliação, mas por decisão daquele, não se abriram as portas do entendimento e da proximidade familiar. Neste contexto cito as palavras do Papa Francisco, “ o Perdão é a essência do Amor, sabe compreender o erro e colocar remédio.”
Um Rádio de marca Philips era o seu companheiro inseparável, através do qual ouvia as notícias de Portugal, e muitas vezes tinha de o esconder dos invasores indonésios.
Nos dias de hoje, cria alguns animais e frutas que vende em Díli, principalmente para o Hotel Timor, e, apesar das dificuldades económicas, continua a ajudar os vizinhos.
De Aldeia de Joanes, há mais de cinquenta anos, partiu para Timor este português, que tem feito história social, humana e de luta. As gentes timorenses estimam-no e respeitam-no. Daquilo que sabe deste Homem, talvez merecesse uma melhor investigação, a fim de justificar posterior homenagem na sua terra natal.
Agradeço a colaboração neste texto do Pastor Evangélico Juvenal Calvário Clemente, da Assembleia de Deus, responsável pela ACRAS – Associação Cristã de Reinserção e Apoio Social.
António Alves Fernandes
Aldeia de Joanes
Janeiro/2016