Já tinha ouvido falar neste “Semanário Bairrista – Órgão dos Lavradores do Concelho”, cuja direção e edição pertenciam à Câmara Municipal do Sabugal.
No interior do Jornal do Fundão da semana passada, encontrei uma cópia perfeita do nº 1, Ano I de 18 de Julho de 1926. O semanário “Aguilhão” tinha uma tiragem de 500 exemplares, distribuídos gratuitamente.
Com o jornal nas mãos, passo-lhe uma revista demorada porque os temas são muito interessantes, apesar dos muitos anos de idade. Um artigo de fundo fala-nos sobre a História do Sabugal, a sua grande extensão, as fronteiras com outros concelhos, de muitas e variadas produções. Termina com uma referência ao Castelo, o único com cinco quinas, fundado por D. Dinis e ampliado no Séc. XV: “ encontra-se hoje muito deteriorado, servindo de Cemitério, e já foi posto em praça pela primeira vereação republicana, pelo lanço de noventa escudos, não havendo quem quisesse adquiri-lo por este irrisório e insignificante preço.” Nos tempos de hoje, com a crise que se vive, talvez fosse uma boa alternativa colocar em hasta pública o Palácio de S. Bento, o Palácio de Belém, o Castelo de S. Jorge e tantos outros.
A meio da página, em letras destacáveis, leio as “gordas”: “ No Sabugal houve Agitação”; “o Povo do Concelho em Pé de Guerra.”Diz o correspondente que se juntaram 1.600 homens para protestarem contra os impostos do turismo, transações ad-valorem, licença de cães e, para agravar a situação, o Dec. Lei nº 11:069 de 11 de Setembro de 1926, do Ministério da Agricultura e da Direção Geral dos Serviços Pecuários, veio disciplinar o uso do aguilhão, utilizado nos animais “trabalhadores”.
Reza a lei que “ fica proibido na via pública o trânsito de veículos accionados por tração animal…fica proibido de circularem nas cidades e vilas animais que se recusem a fazer o serviço regular…fica proibido o uso dos aguilhões ou qualquer processo que deteriore a pele dos animais…” A seguir vem a lista de sanções, que aplicadas deixariam um lavrador depenado…
Os assuntos chegaram à câmara dos deputados e Joaquim Dinis da Fonseca fez referências aos protestos do povo e salientou que “não é com a tropa que estes clamores, quando justos, se podem sufocar.” E adianta: como o povo pode pagar um imposto de turismos, se há 40 anos se espera uma estrada que ligue a sede do concelho a uma estação? Atira, ainda, que só se discute este problema quando há eleições. Sempre o povo a pagar os impostos e à espera de uma estrada. A Câmara do Sabugal só teve um caminho, demitiu-se.
Também na primeira página, encontro a notícia de dois comerciantes que se dirigiram a uma Tesouraria da Fazenda Pública em Trancoso, com notas falsas de 1.000 escudos, a fim de transferirem dois cheques de 250 contos para Lisboa e Porto. Eram de tão “grosseiro” fabrico que foram engavetados. Foram meter-se na boca do lobo. Hoje, com as novas tecnologias e habilidades, não é preciso atirar com um banco para a bancarrota e não são apanhados os ladrões.
Uma notícia minúscula informa que o Lar dos Pobres recebe os carenciados e os porcionistas mediante inquérito social, atestado pela Junta de Freguesia e pelos Párocos.
Vejo notícias insólitas na rúbrica “ Coisas do Sabugal”: do Castelo “ cemitério-lameiro” do Sabugal saíam carros e mais carros de erva para vender no mercado, alimento dos jumentos; no recinto do mesmo um morto a tiro de espingarda da Nave espera a autópsia. Neste último caso, o Clínico Municipal, o Delegado de Saúde e um escrivão dirigiram-se para o local, mas surgiram dificuldades, não havia uma mesa para deitar o morto. Lá arranjaram um tampo. Depois o coveiro não quis enterrar o autopsiado porque o clínico municipal não lhe pediu “por favor”. Tiveram que ser os médicos legalistas e o escrivão a enterrar o defunto, admoestando o coveiro, embora nada de monta lhe tivesse acontecido.
Entre todas as notícias, a normalidade é resgatada com o calendário das capeias, que começavam em Quadrazais em 28 de Julho e terminavam na Aldeia Velha no dia 25 de Agosto, participando neste único evento de tauromaquia, histórico e arraiano vinte e duas freguesias. Tenho muita pena que a minha terra- a Bismula-, não estivesse lá inscrita.
Valha-nos, ainda, a notícia de que as Termas do Cró tratam as doenças de estômago, intestinos, pele, reumatismo e renites, estando abertas de 15 de Julho a 30 de Setembro.
Foi por estas e outras que nasceu o regime de 28 de Setembro de 1928.
António Alves Fernandes
Julho Aldeia de Joanes
Julho/2013