Foi um dos momentos mais marcantes da minha vida. Tive um convite confidencial para assistir a um missa. Celebrava-se o dia de uma paróquia que vive no anonimato.
Foi a missa mais pequena que assisti na vida. Contou com a presença do Bispo da Diocese, e de alguns párocos, seminaristas e irmãs. Por motivos de segurança não foram tiradas fotos e mesmo organizações católicas não souberam do evento.
Para mim foi uma honra. Era o único estrangeiro e pude testemunhar como nem sempre é fácil ser um católico no mundo.
Lembrei-me dos milhões que morreram em nome de Jesus Cristo para que hoje, a data, esteja referenciada ao seu nascimento em qualquer parte do mundo. E a moral, o respeito pela família, o respeito pela mulher, são tudo frutos da palavra do Senhor e que em Portugal, e noutros países europeus, se ouve com tranquilidade nas diversas igrejas.
Nem mesmo os cânticos foram proferidos, de forma a que o silêncio fosse absoluto e não se denunciasse a presença de um culto católico.
Mesmo a minha viatura ficou estacionada bem longe do ponto de encontro. Por ser facil de identificar, era importante também manter anonimato dado que estou a trabalhar num contexto laico.
A conversa foi interessante, e pude constatar que a tarefa dos jovens sacerdotes não é nada facil. Sem dinheiro, com o peso da cruz, há congregações católicas que ainda pagam a fatura do estado salazarista. Mesmo tendo sido torturados alguns clérigos, no passado, que também lutavam pela libertação do seu povo, o facto é que ainda existe um «aroma» que está díficil desaparecer.
As comunidades católicas que tenho conhecido em Africa, regra geral, têm uma organização e logística que me impressionam. Há mesmo uma zona de muito dificil acesso, onde estou a desenvolver trabalho para a comunidade e se não fosse a missão católica era impossivel dormir e me alimentar. Tinha de acampar com o risco da minha própria segurança. E esse aspecto curiosamente tem provocado alguns dissabores, principalmente com outras confissões religiosas.
Trago esta crónica para que quem vive longe desta realidade entenda a dificuldade de manifestação da nossa Fé. Não se trata de política, mas sim de organizações que procuram um mundo melhor para todos e todas, independentemente do credo, nacionalidade, etnia, sexo, idade e estatuto social.
Os territórios africanos por onde ando pertencem ao antigo Reino Chokué, ainda antes de Cristo ter descido à terra, onde havia o hábito de pensar antes de lutar. «O Pensador» é a imagem mítica que convida todos e todas a reflectir, independentemente das suas convicções.
Por isso os católicos tambem pensam. O caminho do silêncio ajuda a que os objectivos sejam concretizados dentro de uma sã harmonia onde todos e todas ficam a ganhar.
Sacanga, 2 de Outubro de 2020
António José Alçada