Eutanásia, de novo em discussão
Está prometido para a próxima semana, dia 20 do corrente, que o assunto da despenalização da eutanásia irá de novo ao plenário da Assembleia da República.
Convém lembrar o que está em causa, ao ser retomado um assunto que ainda há pouco tempo foi discutido na mesma sede.
Então o que é a eutanásia?
É uma ação ou omissão que, por sua natureza, provoca a morte com o objetivo de eliminar o sofrimento. Equipara-se ao suicídio assistido.
Mas distingue-se da distanásia e da obstinação terapêutica, ou seja do recurso a intervenções médicas já desajustadas e desproporcionadas à situação real do doente.
Portanto, o que está em causa na eutanásia como no suicídio assistido é rejeitar a proteção do valor fundamental e sagrado da vida humana, da qual nenhum homem ou mulher pode dispor e que a sociedade, com empenho de todas as suas instituições, tem o dever de proteger até ao fim.
De facto, o direito à vida é aquele sem o qual todos os outros não têm valor nem sentido e deve ser defendido em todas as circunstâncias mesmo que, pressionada por condicionantes sociais adversas, quaisquer que elas sejam, a pessoa que sofre chegue ao extremo de pedir que lhe antecipem a morte.
Então recusar a alguém que chega ao extremo de pedir a morte a satisfação deste seu pedido não será um atentado contra a liberdade?
Mesmo admitindo que o respeito pela liberdade pessoal é obrigação de todos, de facto, nunca poderá haver garantia absoluta de que a pessoa que pede a morte manterá essa decisão, se as circunstâncias se modificarem. E todos sabemos que há formas sofisticadas de induzir sobretudo nos mais débeis, seja por razões de idade seja por razões de doença incurável ou outras, o pedido da eutanásia. É assim que não podemos considerar normal que em países desenvolvidos que introduziram esta prática haja diariamente dezenas de pessoas a serem eutanasiadas.
Não poderemos consentir que as pessoas possam vir a ser tratadas como matéria descartável, pois para a sociedade promover a eutanásia será sempre mais barato do que investir em condições de apoio aos mais frágeis, como é o caso da rede de cuidados paliativos, que no nosso país só está capaz de atender uma parte diminuta da população.
Pela parte que me toca, tenciono deixar por escrito a minha declaração de vontade de que, se, por qualquer motivo, algum dia eu cair na tentação de pedir para ser eutanasiado, não me levem a sério, mas, pelo contrário, considerem que, de facto, perdi o uso das minhas faculdades mais nobres.
Aos Senhores deputados desejo lembrar que, depois de recusada a despenalização da eutanásia ainda recentemente, na última legislatura da assembleia da República, este assunto foi um não assunto na campanha eleitoral que precedeu as últimas eleições.
Por isso, não será honesto nem politicamente correto aproveitarem a nova relação de forças da atual composição do hemiciclo parlamentar para tomarem decisões sobre assuntos tão graves como a eutanásia, nas costas dos eleitores, o que pode pelo menos ser considerado uma traição.
Apelo, por isso, também à responsabilidade ética e política dos nossos deputados para se posicionarem corretamente na defesa da vida, quando for discutido e votado este assunto.
10.2.2020
+Manuel R. Felício, Bispo da Guarda