UMA VIAGEM GASTRO-LITERÁRIA E CULTURAL
Era uma manhã primaveril de sábado do mês de Abril. No Fundão aguardava-se a comitiva da AFAI (Associação dos Funcionários Aposentados dos Impostos),fundada em 2005,com escritura de constituição, no Cartório Notarial da Covilhã, com destino ao Arneiro (Nisa), para mais um convívio. Eram aposentados dos impostos, mas pagam impostos.
Neste tempo de espera recorda-se a apresentação na véspera do livro “ O Deputado da Nação,” da autoria de Manuel da Silva Ramos e Miguel Real, na Biblioteca Eugénio de Andrade do Fundão, um espaço literário que nos faz andar acordados. Algumas das leituras efetuadas foram delirantes e surreais, uma obra de ficção que retrata este país que é nosso.
Aparece um Umbelino Damião, nascido no interior pobre desta nação, emigra para França, assiste ao Maio de 68, segue para o Brasil. Regressa à pátria e embarca em comissão militar para Moçambique, entra na Guerra do Ultramar. Finda a comissão, não tem trabalho e na capital do império abre um bordel, que começa a ser frequentado pela alta sociedade e pelo presidente de partido, que lhe abre o caminho da vida política. Eleito deputado, faz diversas legislaturas. Extra hemiciclo faz negócios chorudos com autarcas, lojas chinesas e afins. Com a colaboração da sua Faustina e com o seu estilo oportunista, charmoso e simpático, alcança uma verdadeira riqueza.
Nas páginas finais do livro é aliciante ler,” uma multidão em desordem vem direto a mim e diz-me que devo ir a Bruxelas defender a sua causa. A causa, confessam imediatamente, são touradas com morte de touro. “ São de Barrancos”, pergunto-lhes. “ Não, somos da Bismula!” Respondem. O Deputado da Nação, apanhou o avião para Paris e comboio para Bruxelas a fim de defender a causa dos Bismulenses,” a causa de todos os amantes da Capeia Arraiana e das Touradas.
Umbelino Damião, o deputado, repete inúmeras vezes “ a minha vida dava um romance” e realmente deu. Chegou o autocarro e partimos.
Ao olhar para os rostos da geração destes reformados, que recordam os seus tempos de profissão, conclui-se que tiveram uma vida de responsabilidades.
Na passagem pela EN18, em Vila Velha de Rodão, junto ao Tejo, lêem-se frases – “ Tejo mais limpo, não matem o Tejo, Poluição no Tejo, Tejo perigoso”,- ao estilo das que eram escritas, na longa noite fascista.
Em Arneiro já se respira a paisagem alentejana, já surgem os respetivos sinais, no casario e nos costumes, na gastronomia, no artesanato. Já foi rica nos tempos romanos e medievais, com a extração de oiro existente no Conhal (uma extensa escombreira formada por gigantescos amontoados de seixos). D. João III mandou fazer com esse precioso metal um cetro real e Vasco da Gama uma cruz.
O responsável pela viagem distribuiu o Boletim Informativo, que no editorial salienta: “ a AFAI é uma associação vocacionada para defender e promover um convívio saudável e harmonioso entre os associados organizando e patrocinando atividades culturais, recreativas e desportivas, com o lema: SERVIR E FAZER MAIS E MELHOR.”
O restaurante o “ Túlio” apresentou uma invejável ementa: sopa de peixe, arroz de lampreia, ensopado de enguias e tigelada, uma maravilha que satisfez o contento de todos.
As três barcas há muito que estão paradas, as redes (tarrafas), já não funcionam no Tejo e o último artesão – Jaime da Graça São Pedro-, de 85 anos, já não tem forças para trabalhar as tábuas.
No regresso visitou-se, no concelho de Proença-a-Nova, o miradouro das Portas do Almourão, na Foz do Cobrão, uma obra-prima que nos oferece altas montanhas e o desfiladeiro com o Rio Ocreza, uma visita aconselhada. Há milhões de anos verificou-se a deslocação de areias e argilas no oceano e uma colisão de placas litosféricas que levou à formação de uma cordilheira de montanhas de deformação das rochas sedimentares -dobras tectónicas. Entre abraços de despedida, ficou a certeza de que a direção da AFAI não poupará esforços e boas vontades para manter e concretizarar as ações no plano de atividades do ano 2016, aprovado em Assembleia Geral.
Francisco Amaro, Presidente da Assembleia Geral, em breves palavras, referiu que a génese da fundação foi dar continuidade a uma amizade que se cimentou na vida ativa, dando-lhe também valências culturais, sociais e turísticas.
António Alves Fernandes
Aldeia de Joanes
Abril/2016