“Princípio do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus”. Estas palavras iniciais, que podemos considerar como o título de todo o evangelho, indicam qual é o propósito do Marcos: mostrar que Jesus é o Messias (o Cristo) e o Filho de Deus. Esta é efectivamente a Boa Nova (o Evangelho) da salvação e, ao mesmo tempo, o
fundamento (o princípio) da fé e da vida cristã.

O evangelista não diz nada sobre o nascimento e a infância de Jesus. Limita o seu relato ao tempo do ministério público, que vai do Baptismo até à Ascensão ao Céu. Este é tempo em que Jesus, por meio de palavras e obras, revela que é realmente o Messias e Filho de Deus e, desse modo, os homens podem descobrir a sua verdadeira identidade. Quase no final do evangelho, Marcos oferece-nos o testemunho de um centurião romano. Um homem pagão, responsável pela execução da sentença que condenou Jesus à morte, ao ver o modo como Ele morreu, descobriu e confessou: “Verdadeiramente este homem era Filho de Deus” (Mc 15,39).

“Vou enviar o meu mensageiro”. A primeira narrativa de Marcos é sobre João Baptista. Não admira, pois ele precede Jesus e tem como missão preparar o povo de Israel para O acolher. Situa-o na linha do anjo/mensageiro” de que se fala em Ex 23,20 e da “voz que clama no deserto” a que se refere Is 40,30.

No contexto do Êxodo e tendo como cenário o Sinai, Deus, para encorajar Moisés a continuar a missão de conduzir o povo até à terra prometida, promete-lhe um anjo/mensageiro que o acompanhará e guardará no caminho que falta percorrer. Deus adverte Moisés que, para ser bem sucedido, deve manter-se atento à presença do anjo e escutar/seguir sempre a sua voz/palavra (Ex 23,21). Por sua vez, no tempo do exílio da
Babilónia e anunciando o seu fim iminente, Deus fala de um profeta (“uma voz clama”) que preparará o povo para tão extraordinário acontecimento. Com a sua voz/palavra, o profeta levará o povo ao arrependimento, a abater os montes do seu egoísmo, a preparar o caminho do Senhor. A conversão do povo é condição para que o Senhor caminhe e regresso com ele a Jerusalém e aí estabeleça de novo a sua morada.

“Vou enviar o meu mensageiro”. João Baptista é o mensageiro que, precedendo Jesus, anuncia a sua chegada e o início da sua missão. Ele é o profeta que actua e faz ouvir a voz no deserto. É para aí que convoca os judeus, seus contemporâneos. No deserto, longe das ocupações e preocupações da vida quotidiana, as pessoas podem escutar e perscrutar mais atentamente a palavra de Deus, deixando que ela penetre na sua vida e a transforme. De facto, são muitos os que vão ao encontro de João e, interpelados pela sua palavra, confessam os pecados e são baptizados por ele no rio Jordão.

João tem plena consciência de que é apenas mensageiro e profeta de Deus. Não tem algo de seu para dar às pessoas. Por isso mesmo, também não tem qualquer pretensão de formar e chefiar um grupo de seguidores. Ele sabe que a sua missão é orientar os homens para Jesus. Nesse sentido, diz abertamente aos seus ouvintes que
Aquele que vai chegar é superior a ele e tem algo de incomparavelmente mais valioso para lhes dar: “baptizar-vos-á no Espírito Santo”. Só Ele lhes poderá garantir a vida e a salvação de Deus. Por isso mesmo, é para Jesus que eles devem olhar, é n’Ele que devem acreditar, é a Ele que devem seguir.

“Vou enviar o meu mensageiro”. Apesar de ter vindo há mais de dois mil anos, são muitos, um pouco por toda a parte, aqueles que desconhecem ainda por completo tal facto. Daí, a necessidade de mensageiros que falem de Jesus e O levem até à vida dos homens. Nós, os cristãos, devemos ser esses mensageiros no hoje do nosso mundo.

Devemos ser a voz que, no deserto da ignorância, da indiferença e da apatia religiosas, proclame a todos que Jesus já veio e é realmente o Messias libertador, o Filho de Deus, o Salvador da humanidade. A nossa vida, mais do que a nossa voz, deve ser o caminho pelo qual Jesus chega até aos homens e, ao mesmo tempo, motiva os homens a aproximarem-se de Jesus. Mas só o seremos, na medida em que nós próprios fizermos de Jesus o nosso Caminho, identificando-nos totalmente com Ele.

Pe. José Manuel Martins de Almeida