XI – Domingo Comum

“Ficará mais seu amigo …”

 

            Uma mulher pecadora, conhecida por todos como tal, aproxima-se de Jesus e senta-se a seus pés, enquanto Ele toma uma refeição em casa de um fariseu. A mulher entra em casa de Simão sem ter sido convidada. Nenhum fariseu convidaria uma mulher como ela para sua casa, pelo menos à luz do dia. Depois, mostra uma inexplicável confiança e um exagerado à vontade com Jesus. Surpreende e escandaliza com os seus gestos. Nenhuma mulher normal se atreveria a tanto e nenhum homem o consentiria, pelo menos em público.

            O que motiva a mulher a ter este atrevimento e esta ousadia, a fazer o que vai contra todas as normas sociais e a sujeitar-se, por isso mesmo, à censura de todos? Que fascínio ou paixão sente por Jesus, para não poder deixar de se encontrar ali com Ele, na casa de um estranho, e agir daquele modo diante de todas as pessoas? A mulher sabe que Jesus acolhe os pecadores, deixa que estes se aproximem d’Ele e Ele mesmo vai pessoalmente ao seu encontro, manifestando-se compreensivo e misericordioso com todos. Pressente, tem a certeza que também ela será bem acolhida e poderá contar com a sua compaixão e misericórdia.

            A mulher sente em si o peso do pecado e como ele perturba a sua vida. Ao mesmo tempo, sabe que só Jesus a poderá perdoar, devolvendo-lhe a paz. Por isso mesmo, ela não quer, não pode, não deve perder aquela oportunidade de se encontrar com Ele. Sem respeitos humanos, sem se deixar condicionar pelo que as pessoas possam pensar, a mulher avança no seu propósito e senta-se aos pés de Jesus. Esta é a atitude de quem já se sente ou quer ser seu discípulo, de quem está disposto a segui-l’O, a viver segundo a sua palavra.

            A mulher está ali aos pés de Jesus, porque também tem algo muito íntimo e urgente para Lhe dizer. Algo que não pode dizer com palavras. As palavras não são suficientemente capazes de exprimirem os sentimentos que lhe vão na alma. Considera mais adequados e expressivos os gestos. Assim, com as lágrimas abundantes que jorram dos seus olhos e banham os pés de Jesus, a mulher manifesta o mais sincero e radical arrependimento. E o arrependimento comove sempre o coração de Deus. É o abrir a porta, a licença que o homem dá a Deus para entrar na sua vida e o amar. Com os beijos, exterioriza o seu amor. O amor de quem se sente amada e respeitada por Ele. Mais, o amor de quem sabe que o amor de Deus precede e motiva a sua conversão. Por fim, o perfume simboliza a alegria do encontro, que é um encontro de salvação. Em Jesus, a mulher reencontrou-se com Deus, ou melhor, deixou-se encontrar por Deus. Quando isso acontece, Deus alegra-se e a sua alegria contagia o coração do pecador arrependido.

            Simão, prisioneiro dos seus preconceitos de fariseu, não só considera condenáveis os gestos da mulher como condena, ainda mais, a “passividade” de Jesus, ou seja, o facto de pactuar com ela. Ao ver que tolera tudo o que ela faz, em vez de a repreender e afastar, o fariseu põe em causa que Jesus seja realmente um profeta. Segundo ele, um verdadeiro profeta tem a capacidade de reconhecer tais pessoas e tem a obrigação de não conviver com elas.

            Simão pensa, no seu íntimo, que Jesus não sabe quem é a mulher. Porém, Jesus não só sabe quem ela é como sabe o que ele acaba de pensar a seu respeito. Apesar de estar em sua casa e ser seu convidado, Jesus não deixa de reprovar a sua atitude interior, pondo em evidência o valor e o profundo significado dos gestos da mulher. Foi Simão que O convidou, mas foi a mulher que cumpriu as normas da hospitalidade: lavar os pés, beijar e perfumar. O fariseu recebeu Jesus em sua casa, deu-Lhe um lugar de destaque à mesa, serviu-lhe uma óptima refeição. Mas não se apercebeu que Jesus tinha algo de especial para lhe oferecer, não lhe abriu o coração, perdeu o dom de Deus.

            “Ficará mais seu amigo … aquele a quem mais perdoou”. Primeiro, o perdão, o amor de Deus. Depois, vem o arrependimento e o amor do homem. Deus ama primeiro e o amor de Deus torna o homem capaz de amar. Não é o muito amor da mulher que leva Deus a perdoar-lhe os seus muitos pecados. Antes, o muito amor de Deus, acolhido pela mulher, é que a faz capaz de amar muito. Perdoados os seus pecados, a mulher retira-se em paz, começa uma vida nova, uma vida com dignidade e futuro.