SABUGAL – RECORDAR O TIO ANTÓNIO REINO “O FERRADOR”
Em 25 de Novembro de 1915 nasceu em Vale de Espinho, junto à zona arraiana sabugalense, com um pai pastor e contrabandista e a mãe doméstica. Aos cinco anos ficou órfão paternal e teve de ajudar na pastorícia, guardar o rebanho, motivo pelo qual lhe foi interdita a escola primária, ficando sem saber ler nem escrever.
A mãe viúva casou com um ferrador de Vale de Espinho e o padrasto Clemente deu-lhe as primeiras lições de bem ferrar, além de continuar com as ovelhas e com o trabalho agrícola.
Aos quinze anos traçou o caminho da libertação: pegou na trouxa, um saco com pão, queijo e seguiu o destino de Inguias (Belmonte), para junto de um ferrador profissional – o senhor Ismael das Inguias de origem judaica.
Seguiu para as obras da Covilhã com a missão de aguçador de ferramentas, onde o salário aumentou. Entretanto, conheceu Josefa Vilaboa, natural do Meimão, com quem casou e desta união conjugal nasceram um filho e uma filha.
Fixou residência na terra da mulher, organizou uma forja, uma oficina de ferrador, e começou a exercer a profissão de ferrador por conta própria, uma atividade importante para a época, dado que os transportes de pessoas e bens eram por tração animal e o cultivo das terras também passava por aquela força. Também alongava a atividade de ferrador a Malcata, a fim de ganhar mais alguns tostões.
Ao fim de seis anos naquela localidade, mudou-se para o Sabugal e instalou-se no Curral do Orlindo Mono, perto do atual largo da Estátua do Bombeiro. Falecido o ferrador, o Tio Guilherme, o Tio António Reino alugou à viúva a forja e a oficina situada na Rua Nuno de Montemor, onde trabalhou quatro anos. Aqui a clientela aumentou, principalmente nos dias em que se realizavam os mercados quinzenais e as feiras. Vinham das aldeias vizinhas, Rendo, Torre, Malcata, Aldeia de Santo António, Peladas, Quadrazais, entre outras. Ali se ferravam jumentos de quatro patas, mulas, machos e animais cavalares. No tronco era o local onde o gado vacum levava “sapatos novos”. Também à socapa, lá deu alguns conselhos clínicos para um ou outro animal doente, nalguns casos alguma purga para melhorarem, às escondidas do veterinário.
Comprava barras de ferro e com a sua arte de ferrador fazia os cravos e as ferraduras. A “pasta” para soldar o ferro vinha de Espanha, via contrabando.
Em complemento da profissão de ferrador, trabalhava no cultivo das terras e ainda tinha um grupo de contrabandistas.
Louvável a sua ação humanitária ajudando muitos espanhóis que fugiam da Guerra Civil do seu País, dando-lhes comida e abrigo.
Apesar dos vários anos de ferrador, o efeito económico não se sentia. Ganhava um escudo por ato de ferrar, o que não dava para o petróleo. Com a avalanche emigratória, ainda pensou ir para a Argentina, atravessar a fronteira castelhana e seguir para Cádis onde apanharia transporte para aquele país sul-americano, juntando-se a alguns dos seus familiares que há muito lá se encontravam.
Escolheu a ida para França de assalto. A primeira viagem correu muito mal. Atravessam os Pirenéus a pé e foram apanhados em território francês, recambiados para Portugal de comboio. Mas o Tio António Reino, astuto contrabandista, saiu e deu indicações a todos os seus companheiros para saltar do comboio umas estações antes de chegarem à fronteira portuguesa. Assim, livraram-se de serem atirados para a Cadeia Civil de Almeida. Passada uma semana, houve nova aventura a caminho de França, conseguindo o Tio António Reino chegar com êxito à cidade de Clermont-Ferrand, domiciliando-se na vila de Billom, na província de Puy de Dome, onde viria a trabalhar na construção civil e se manteve durante quinze anos.
Regressou a Portugal e, aos 94 anos, descansou em Paz no Cemitério do Sabugal.
António Alves Fernandes
Aldeia de Joanes
Dezembro/2016